PET Ciências Biológicas – UFV Viçosa, julho de 2009 * Nº58
Vila Gianetti, 30*(31) 3899-2295*www.ufv.br/petbio*petbio@ufv.br |
Prof. Lino Neto; Aline Mello; Carla Oliveira; Felipe Prado; Fernanda Martinelli; Fabiana Freitas; Francisco Castanon; Guilherme Carvalho; Jansen de Souza; Juliana Benevenuto; Lucas Dornelas; Marcela Cristine; Tarcísio Duarte. ___________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________ |
Artigos
|
Eu Sou Assim
Eduardo Loureiro Jr.
|
|
|
Presentemente, eu sou assim. Até sou também o que já fui um dia, mas ainda não sou o que um dia serei. Não conto com o ovo no cu da galinha. Eu sou assim. Eu sou assim. A alegria de acordar com o sol e a tristeza de ser despertado. A insônia criativa que acende a madrugada e o dormir cedo, antes das dez. Eu sou assim. A preguiça da rede sempre armada e o pé no sopé da montanha, pronto para a escalada. Eu sou assim. O melhor lugar é a casa, sem |
Fonte: http://idgnow.uol.com.br |
||
nem vontade de ir na esquina, e a passagem comprada para dar a volta ao mundo e conhecer suas sete maravilhas.Eu sou assim. O silêncio pelo silêncio, sem vazios nem meditação, e a comunicação instantânea: os e-mails que às vezes não voltam, mas que sempre vão. O autismo mudismo e a verborragia escorregadia. Eu sou assim. O homem só. Um homem só, bendito entre as mulheres. E o misógino que mais as odeia quanto mais as entende. Eu sou assim. O romântico incorrigível e o sangue frio. Romeu Tuma e Romeu Montéquio. Eu sou assim. Só penso naquilo e, quando estou naquilo, não penso. Eu sou assim. O eremita isolado no topo do mundo e apenas mais um na multidão. O pretérito poético do passado e o futuro científico da ficção. Os grupos e grupos de amigos e meu único e velho umbigo. Eu sou assim. O pai do filho que nunca tive e o nunca filho do pai que me teve. Eu sou assim. O labirinto intrincado e o sempre aberto pátio. A garra da águia e o canto do pássaro. Eu sou assim. O Judas que ajuda e o Pedro que pedra. O contentamento com as minúcias e o desagrado com os noventa e oito por cento. Eu sou assim. O menino traquinas e o velho gagá. O professor que sempre aprende e a criança que dá aula. Eu sou assim. A palavra que emenda e a palavra que corta. A palavra que arranha e a palavra que alisa. O cuspe na cara e o beijo na boca. A barba por fazer e a cara de bebê. O cabelo comprido e o cabelo raspado. A careca de herança e as sobrancelhas fartas. Eu sou assim. O computador e a analogia. A crônica aguda e o lápis desapontado. Eu sou assim. A fusão com o outro até o meu próprio esquecimento e eu mesmo virado do avesso. As asas do anjo e os dentes do vampiro. Renascido no inferno e padecido no céu. Eu sou assim. O cão e o gato. O que assusta e o bonito. Eu sou assim. A cabeça nas nuvens e o detalhe da programação. O estudo do plano e a liberdade do improviso. Eu sou assim. O isso e o aquilo. Eu sou assim. A poesia na hora da prosa, a prosa manchando a poesia. A pele e o osso. A flor da pele e o espinho do osso. A declaração de amor e o "vai catar coquinho". Eu sou assim. Pão-duro e pau mole. Miolo mole e cabeça dura. Eu sou assim. A tese e a antítese sem síntese. Dou-lhe uma, dou-lhe duas... três é demais. A polêmica esganiçada e o tanto faz. O carrasco de quem não merece e o salvador de quem não precisa. O parteiro e o suicida. Eu sou assim. O homem mais fiel que existe e a atração irresistível pela mulher que passa. O amor à primeira vista e a paixão que só chega dez anos depois. O olhar do tarado e os olhos de moça. Eu sou assim. O livro infantil e o vídeo pornográfico. Eu sou assim. Vapores expansivos de Júpiter, anéis restritivos de Saturno. Aos turnos, aos turnos. Eu sou o Sol, o Sol, o Sol, o Sol, novo, crescente, cheio, minguante. E sempre a mesma Lua. Eu sou assim. O chão sempre limpo para os pés e a meleca secando na fricção dos dedos. Eu sou assim. Assim. O sim e sua negação. O não do sim, o sim do não. Eu sou assim. E não assado. Presentemente, eu sou assim.
* texto publicado com autorização. Fonte: http://www.patio. com.br/cronica
|