Fonte de Germoplasma de Milho para Eficiência e Resposta à Utilização do Nitrogênio

G. V. MIRANDA, F.F. CANIATO, I.C. SANTOS, A. A. DONÁ, B. M. AGUIAR, J.S. FALUBA, M.A.C.F. MACHADO.

RESUMO

        O objetivo deste trabalho foi identificar fonte de germoplasma de milho e avaliar critérios para a identificação de cultivares eficientes e responsivos à utilização de nitrogênio. Os ensaios foram conduzidos em Viçosa, MG, na Universidade Federal de Viçosa. O delineamento experimental utilizado foi o látice 6 X 6 com três repetições. Os cultivares avaliados foram híbridos, populações locais e melhoradas e cultivares de polinização aberta comerciais. Cada parcela foi constituída de três fileiras de cinco metros espaçadas em 0,90 metro. Para simular ambientes com alto e baixo de nitrogênio, que correspondiam aos ensaios, foram utilizadas as doses de 20 e 120 kg.ha-1 de N em cobertura, respectivamente. Para identificar os cultivares eficientes e responsivos utilizaram-se dois critérios. O primeiro foi de acordo com a definição que a eficiência é a média de produtividade de grãos em baixo N e a resposta é a diferença entre a produtividade de grãos nos dois níveis de aplicação de N dividido pela diferença entre as doses de N. O segundo critério foi à diferença mínima significativa entre os cultivares pelo teste de Tukey nos ambientes alto e baixo nitrogênio para identificar a resposta e a eficiência à utilização do nitrogênio, respectivamente. Para o primeiro critério, os cultivares eficientes e responsivos à utilização do nitrogênio foram UFV M6, AG 122, B 3, BR 106, B 12, B 6 e B 7 e para o segundo critério foram UFV M6, AL 25, AG 122, B 11, BR 201 e B 3. Assim conclui-se que os cultivares eficientes e responsivos ao uso do nitrogênio são UFV M6, AG 122 e B 3, comuns aos dois critérios, igualmente adequados; a metodologia utilizando ambientes contrastantes é eficiente; cultivares com diferentes estruturas genéticas são fontes de germoplasma adequadas para a tolerância ao estresse de baixo nitrogênio.

Palavras-chave: Estresse abiótico, estresse mineral, variedade local, baixo nitrogênio, agricultura familiar.

glauco@ufv.br Universidade Federal de Viçosa, Departamento de Fitotecnia. CEP 36571-000. Viçosa, MG.

INTRODUÇÃO

    Os estresses abióticos causados por restrições edáficas e climáticas são bastante comuns na agricultura brasileira. Os solos tropicais apresentam deficiência em diversos nutrientes, baixa capacidade de troca catiônica e toxicidade de alumínio e manganês que representam sérios obstáculos à produção agrícola. As deficiências nutricionais mais comuns nos solos tropicais e brasileiros estão relacionadas ao N, P, Zn, Ca e Mg (FAGERIA e KLUTHCOUSKI, 1980 e SANTOS et al., 1996).

As estratégias para aumentar a produção das culturas estão relacionadas à melhoria do ambiente para a planta por meio do uso da calagem e adubação química dos solos ou por meio da adaptação e desenvolvimento de germoplasma eficiente na utilização dos nutrientes.

A identificação de germoplasma adaptado às condições adversas de solo é extremamente importante para a produção agrícola com enfoque agroecológico, pois possibilita a redução dos custos de produção e utilização de menor quantidade de nutrientes.

O germoplasma selecionado em condições edafoclimáticas favoráveis não se mostra adequado para ser utilizado em condições de estresses abióticos (CECARELLI, 1996). No caso do milho, questões sociais, culturais e técnicas agravam mais ainda a necessidade da seleção e desenvolvimento de cultivares adaptados às condições da grande maioria dos produtores, que não utilizam de forma adequada os insumos para aumentar a produtividade (IBGE, 1998). Outra questão primordial é que o germoplasma selecionado como eficiente para estresses abióticos seja também responsivo à melhoria do ambiente, pois se espera que o produtor também venha a melhorar o seu ambiente com o passar do tempo.

Do ponto de vista nutricional, as respostas diferenciadas dos genótipos podem decorrer da maior eficiência de absorção, translocação ou utilização dos nutrientes (GERLOFF e GABELSON, 1983). Os melhores critérios para avaliar cultivares mais eficientes na absorção e utilização do nutriente têm sido aqueles que utilizam o crescimento e desenvolvimento das plantas em condições de baixo nível do nutriente, verificando se a resposta ao nutriente é devida ao mecanismo de absorção e/ou de utilização do nutriente para produção de matéria seca (Fleming, 1983 citado por FURLANI et al., 1985). Muitos parâmetros têm sido usados para avaliar plantas mais eficientes na absorção e utilização de um nutriente, como concentração nos tecidos, conteúdo nas plantas, massa seca e quantidade do nutriente na fitomassa. Entretanto, a relação de eficiência deve estar relacionada à parte da planta de interesse econômico para que não se selecione plantas com alta eficiência de absorção e baixa produção econômica.

Para a identificação de germoplasma eficiente e responsivo à utilização do nutriente é necessário estabelecer metodologia que discrimine o germoplasma com alta repetibilidade dos resultados, que seja rápida, que permita avaliar grande quantidade de plantas e que seja de baixo custo.

FAGERIA e KLUTHCOUSKI (1980) e FAGERIA e BALIGAR (1993) desenvolveram metodologia para a seleção de genótipos eficientes e responsivos à utilização de um nutriente. A eficiência na utilização do nutriente foi definida pela média de produtividade de grãos em baixo nível do nutriente. A resposta à utilização do nutriente foi obtida pela diferença entre a produtividade de grãos nos dois níveis do nutriente dividida pela diferença entre as doses de nutriente. Utilizaram a representação gráfica no plano cartesiano para classificar os cultivares. No eixo das abcissas encontram-se os níveis de eficiência na utilização do nitrogênio e no eixo das ordenadas encontram-se os níveis da resposta à utilização do nitrogênio. O ponto de origem dos eixos é a eficiência média e a resposta média dos cultivares. No primeiro quadrante são representados os cultivares eficientes e responsivos, no segundo os não eficientes e responsivos, no terceiro os não eficientes e não responsivos e no quarto os eficientes e não responsivos.

Para obter cultivares mais eficientes e responsivos é necessário ainda, que as diferenças entre os cultivares estejam sob controle genético, que seja herdável e que as populações segregantes possuam variabilidade genética para esta característica.

Assim, o objetivo deste trabalho foi identificar fontes de germoplasma de milho e avaliar a metodologia para a discriminação de cultivares eficientes e responsivos à utilização de nitrogênio.

MATERIAL E MÉTODOS

Os ensaios de avaliação dos cultivares foram conduzidos na Estação Experimental do Aeroporto (620 m de altitude) pertencente ao Departamento de Fitotecnia da Universidade Federal de Viçosa, durante a safra agrícola de 2000/2001. O delineamento experimental utilizado foi o látice 6 X 6 com três repetições. Os cultivares avaliados foram os híbridos AG 122, BR 205, BR 201, CX 533 e AG 405, as populações de polinização aberta pertencentes ao Departamento de Fitotecnia da Universidade Federal de Viçosa UFV M6 e UFV M4, os cultivares de polinização aberta AL 25, BR 106 e Sol da Manhã e as populações locais B 11, B 3, B 4, B 1, B 12, B 6, B 7, Sabugo Fino, B 16, B 22, B 21, B 25, Dente de burro, Maia, Maia antigo, B 23, B 5, B 14, B 24, B 9, B 10, B 17, B 15, Cravo, Asteca e B 13. As populações locais iniciadas com a letra B são oriundas de sementes doadas por produtores que reutilizam sementes de suas próprias populações e não são gerações avançadas de híbridos comerciais.

Cada parcela foi constituída de três fileiras de cinco metros espaçadas de 0,90 metro e com espaçamento entre plantas de 0,20m, com estande final estimado em 55mil plantas.ha-1. O preparo do solo foi realizado com uma aração e duas gradagens. A adubação de plantio foi realizada com base nos resultados da análise química e física do solo, utilizando a fórmula 08-28-16 com fonte de N-P-K, na proporção de 200 kg.ha-1.

Para simular ambientes com baixo e alto de nitrogênio, foram utilizadas as doses 20 e 120 kg.ha-1 de N em cobertura, respectivamente. Para identificar os cultivares eficientes e responsivos utilizaram-se dois critérios. O primeiro foi de acordo com a metodologia proposta por FAGERIA e KLUTHCOUSKI (1980) e FAGERIA e BALIGAR (1993) e o segundo foi a diferença mínima significativa entre os cultivares pelo teste de Tukey nos ambientes com alto e baixo nitrogênio para identificar a resposta e a eficiência à utilização do nitrogênio, respectivamente.

Os tratos culturais foram realizados sempre que necessário e de acordo com as recomendações técnicas para a cultura do milho (BULL e CANTARELLA, 1993). Não houve incidência de doenças e infestação de pragas.

Neste estudo foi utilizada a produção de grãos da fileira central da parcela e então, estimada a produtividade de grãos em kg.ha-1 com correção para 13% de umidade e estande médio (VENCOVSKY e BARRIGA, 1992). As análises de variância e covariância e os testes de F e t (DMS) foram feitas utilizando o programa estatístico SAS (SAS, 1996).

A metodologia adaptada de FAGERIA e KLUTHCOUSKI (1980) e FAGERIA e BALIGAR (1993) em utilizar doses de N em cobertura para criar os ambientes contrastantes em relação ao N foi adequada, pois a média geral da produtividade no ambiente de baixo N foi aproximadamente 60% a do ambiente com alto N (Tabela 1). Esta metodologia mostrou-se viável para programas de melhoramento, pois ensaios de competição fazem parte da rotina, são de baixo custo e permitem a avaliação de grande número de cultivares. No entanto, foi necessário dobrar o número de parcelas em avaliação e quantificar as doses de N que discriminassem os cultivares para o local em que foram instalados os ensaios.

 

RESULTADOS E DISCUSSÃO

 

No ensaio sob estresse de baixo nitrogênio, as maiores produtividades de grãos foram do cultivar comercial AL 25 (4.133 kg.ha-1) e da população melhorada UFV M6 (3.874 kg.ha-1) que, no entanto, não diferiram estatisticamente dos cultivares que produziram acima de 2.900 kg.ha-1 como AG 122, B 11, BR 205, BR 201, B 3 e B 4. Observa-se que, neste ambiente, encontrou-se entre os cultivares mais produtivos, diferentes estruturas genéticas como as populações locais B 11, B 3 e B 4, cultivares de polinização aberta como UFV M6 e AL 25 e os híbridos comerciais AG 122, BR 205 e BR 201, este último inclusive tolerante ao Al tóxico do solo. Portanto, não é o tipo de estrutura genética (híbrido ou de polinização aberta) do cultivar alógamo que proporciona a alta produtividade e sim, a presença dos alelos efetivos que são selecionados quando o germoplasma é submetido ao estresse. No ensaio sob alto nitrogênio, as populações mais produtivas foram B9 (5.646 kg.ha-1) e UFV M6 (5.646 kg.ha-1) que, no entanto, não diferiram dos cultivares que produziram acima de 4.148 kg.ha-1 como AG 122, B 12, B 17, BR 106, B 14, B 3, B 6, B 22, BR 201, B 11, Maia, B 23, CX 533, Maia antigo, B 21, AL 25 e B 25. Novamente foram encontrados germoplasmas com diferentes estruturas genéticas entre os mais produtivos. Portanto, o critério de usar o teste de Tukey para discriminar os cultivares, classificou como eficientes e responsivos UFV M6, AL 25, AG 122, B 11, BR 201 e B 3.

O critério de acordo com FAGERIA e BALIGAR (1993) identificou como eficientes AL 25, UFV M6, AG 122, B 11, BR 205, BR 201, B 3, B 4, BR 106, B 1, UFV M4, CX 533, B 12, B 6, B 7, Sabugo Fino, Sol da Manhã e B 16 e como responsivos B 9, B 17, B 14, B 12, B 22, BR 106, Maia, B 6, B 23, B 10, Asteca, Maia antigo, B 24, B 3, Cravo, AG 122, UFV M6 e B 25. Assim, os cultivares eficientes e responsivos à utilização do nitrogênio foram UFV M6, AG 122, B 3, BR 106, B 12 e B 6.

Ao comparar os resultados dos dois critérios, os cultivares comuns foram UFV M6, AG 122 e B 3.

CONCLUSÕES

Assim conclui-se que os cultivares eficientes e responsivos ao uso do nitrogênio pelos dois critérios utilizados, são UFV M6, AG 122 e B 3; a metodologia utilizando ambientes contrastantes é eficiente; cultivares com diferentes estruturas genéticas são fontes de germoplasma adequadas para a tolerância ao estresse de baixo nitrogênio.

TABELA 1 - Produtividade de grãos, eficiência e resposta à utilização do nitrogênio de cultivares de milho nos ensaios conduzidos na Estação Experimental do Aeroporto, Viçosa, na safra agrícola 2001/0022

Produtividade de grãos

Nitrogênio

Cultivares

Baixo N

Alto N

Média

Eficiência

Resposta

B 4

3.003

3.972

3488

3.003

9,69

B 15

1.711

2.344

2028

1.711

6,33

BR 205

3.373

3.816

3595

3.373

4,43

B 9

1.841

5.679

3760

1.841

38,38

B 17

1.713

5.453

3583

1.713

37,40

B 14

2.090

5.245

3668

2.090

31,55

B 12

2.736

5.567

4152

2.736

28,31

B 22

2.521

5.091

3806

2.521

25,70

BR 106

2.855

5.399

4127

2.855

25,44

Maia

2.216

4.731

3474

2.216

25,15

B 6

2.718

5.205

3962

2.718

24,87

B 23

2.170

4.431

3301

2.170

22,61

B 10

1.720

3.900

2810

1.720

21,80

Asteca

1.512

3.624

2568

1.512

21,12

Maia antigo

2.192

4.294

3243

2.192

21,02

B 24

1.993

4.087

3040

1.993

20,94

B 3

3.186

5.215

4201

3.186

20,29

Cravo

1.686

3.578

2632

1.686

18,92

AG 122

3.746

5.572

4659

3.746

18,26

UFV M6

3.874

5.646

4760

3.874

17,72

B 25

2.448

4.213

3331

2.448

17,65

BR 201

3.347

5.081

4214

3.347

17,34

B 21

2.511

4.238

3375

2.511

17,27

CX 533

2.753

4.353

3553

2.753

16,00

B 16

2.525

4.109

3317

2.525

15,84

Sol da Manhã

2.614

3.968

3291

2.614

13,54

B 1

2.827

4.120

3474

2.827

12,93

B 11

3.467

4.731

4099

3.467

12,64

UFV M4

2.818

4.071

3445

2.818

12,53

B 5

2.131

3.365

2748

2.131

12,34

Sabugo Fino

2.663

3.860

3262

2.663

11,97

Dente de burro

2.326

3.506

2916

2.326

11,80

B 7

2.697

3.719

3208

2.697

10,22

AL 25

4.133

4.227

4180

4.133

0,94

B 13

1.156

1.247

1202

1.156

0,91

AG 405

935

934

935

935

-0,01

Média

2.506

4.239

3.372

2.506

22,0

DMS 5%

1.231

1.531

-

-

-

 

LITERATURA CITADA

BULL, L.T; CANTARELLA, H. Cultura do Milho Fatores que afetam a produtividade. Piracicaba: POTAFOS, 1993. 301 p.

CECCARELLI, S. Adaptation to low/high input cultivation. Euphytica, v. 92, n. 1/2, p. 203-214, 1996.

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FURLANI, A. M. C; BATAGLIA, O. C; LIMA, M. Eficiência de linhagens de milho na absorção e utilização de fósforo em solução nutritiva. Bragantia, v.44, n.1, p.129-147, 1985.

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SAS INSTITUTE SAS/STAT user’s guide. Cari, NC, USA: SAS Institui. 1996

SANTOS, M.X.; LOPES, M.A.; COELHO, A.M.; GUIMARÃES, P.E.O; PARENTONI, S.N.; GAMA, E.E.G.; FRANÇA, G.E. Drought and low N status limiting maize production in Brazil. In: DROUGHT AND LOW N-TOLERANT MAIZE, 1996, El Batan, Mexico. Proceedings... El Batan: CIMMYT, 1996.

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VENCOVSKY, R; BARRIGA, P. Genética Biométrica no Fitomelhoramento. Revista Brasileira de Genética, Ribeirão Preto, SP. 487 p, 1992