11a Aula

AS VÁRIAS FACES DA EVOLUÇÃO DA CRISE

Assim como no caso americano, a criação e liberalização dos sindicatos engendraram na sociedade japonesa um agudo conflito distributivo, o qual materializado por longas greves, paralizava todo o processo produtivo, o que não interessava a nenhuma das partes. A saída encontrada foi a extinção dos sindicatos tipo ocidental e sua transformação em sindicatos corporativos de empresa, onde em troca da perda de autonomia, os trabalhadores ganharam o conhecido sistema de emprego vitalício, ao qual se associa o de salários fixos crescentes por antiguidade, atrelados a uma pequena parcela de ganhos variáveis. Com esse cenário o toyotismo se intensifica, viabilizando a obtenção de ganhos contínuos de produtividade.

A solução japonesa não repassava para os salários a totalidade de sua parte nos ganhos de produtividade, o que garantia um acelerado crescimento dos lucros na economia. A pergunta importante a fazer seria de como o processo se manteve sem apresentar crise especulativa/insuficiência de demanda agregada. A resposta reside no fato de que o Japão no pós-guerra, era não só uma economia devastada pela guerra, mas também eminentemente rural. Para que o país crescesse seria necessário que os escassos recursos externos fossem alocados para a importação de equipamentos e não de alimentos: era necessário acelerar rapidamente a produtividade do campo.

Todo o processo de desenvolvimento urbano-industrial não foi comandado por mecanismos de mercado, o que garantiu um processo de crescimento onde o risco de insuficiência de demanda agregada foi mínimo. Ao distribuir a maior parcela dos ganhos de produtividade em favor dos lucros o país assegurava uma elevada taxa de poupança interna, possibilitando uma taxa de investimentos ainda mais elevada com o efeito multiplicador de uma inigualável taxa de crescimento econômico.

Apesar do sucesso das políticas intervencionistas nas economias asiáticas o mundo ocidental preferiu entender o processo como a vitória do liberalismo devido ao fracasso das estratégias de desenvolvimento socialistas e do intervencionismo latino-americano. O liberalismo, no caso, consistia em economias internacionalmente abertas ao fluxo de capitais e em mercados de trabalhos flexíveis. Com isso, a partir de meados dos anos 80, as economias ocidentais buscaram a essência do modelo japonês, o que resultou em um enorme fracasso devido ao fato de que as economias não eram relativamente pequenas e nem essencialmente rurais.

A partir dos anos 80, com o retorno dos preços do petróleo aos patamares anteriores, as importações se estabilizam, levando a balança comercial japonesa a gigantescos superávits. São esses superávits, que se refletem na conquista de mercados externos, sem a abertura do próprio mercado, que garantem a realização de investimentos compatíveis com as necessidades internas. Ocorre que os benefícios de superávits só se manifestam em detrimento de crescentes déficits em outros países. Essa solução para o jobless growth é uma solução que não existe pois, por uma inevitabilidade contábil, todos os países não podem ser superavitários ao mesmo tempo.

Com a desvalorização da moeda a economia japonesa passa a deslocar seu excedente para os mercados especulativos de câmbio/bolsas/imóveis, que passam a apresentar taxas de crescimento e rentabilidade espetaculares. Com a percepção de uma dinâmica explosiva em termos de um processo especulativo, o Estado intervêm e provoca uma recessão onde a economia abandona a dinâmica de crescimento acelerado e passa a conviver com taxas bastante baixas.

Decorrente dos pesados custos salariais, as empresas passam a ter problemas de competitividade e lucratividade devido ao sistema de emprego vitalício e se inicia um movimento para se romper com essa estabilidade no emprego, como alternativa  ao início do processo de elevados níveis de desemprego aberto. Como se observa, em que pesem as virtudes do toyotismo, com a automação flexível, vencido o ciclo neomercantilista-especulativo, também o Japão se insere na crise do jobless growth.

Se o sucesso japonês dos anos 80 impedia a análise da crise como decorrente do novo paradigma tecnológico, o sucesso americano dos anos 90 impede a visão da própria crise. A explicação para o fenômeno é a conhecida queda dos salários dos trabalhadores americanos. Refutada a hipótese de globalização, a segunda explicação é de caráter endógena e se baseia na moderna tecnologia de base microeletrônica que exige um trabalhador bem mais qualificado. Nesse contexto os trabalhadores qualificados participam progressivamente do custo salarial, ao passo que os menos qualificados, para manterem seus empregos, aceitam salários decrescentes.

A explicação acima é contestada pois embora a diferença salarial tenha aumentado, os salários reais dos mais qualificados também apresentam quedas progressivas. A única explicação defensável seria a retratada pelo fato de que os empregos americanos tem crescido quase que exclusivamente no setor terciário e através de uma dinâmica perversa de concentração de renda, os Estados Unidos, ao contrário da social-democracia européia caracterizada pela rigidez salarial, conseguem minimizar os efeitos do crescimento sem emprego enquanto durar a expansão dos serviços pessoais que já demonstram sinais de esgotamento.