Universidade Federal de Viçosa

Programa de Pós Graduação em Genética e Melhoramento

                              

 

 

MESA REDONDA

 

Evolução: Uma Revolução no Pensamento

 

 

 

Jacqueline Siqueira Glasenapp, Juliana Stival Sena, Maíra Cristina Menezes Freire, Caio Césio Salgado, Gustavo A. M. Guimarães

 

 

Antes de Darwin, não apenas as pessoas comuns, mas a própria ciência acreditava que todas as formas de vida existentes seriam idênticas às do instante da criação ocorrido 4 mil anos a.C. e que um ser todo poderoso havia criado o céu e a terra de forma tão harmoniosa que animais e plantas podiam viver adaptados à natureza com perfeição.

Os primeiros abalos as idéias criacionistas surgiram quando os geólogos se deram conta de que nosso planeta era muito mais antigo e os paleontologitas desenterraram os primeiros fósseis, contradizendo as teorias de um mundo de composição constante.

 Embora muitos cientistas questionassem a imutabilidade das espécies e Lamark já houvesse proposto em 1809 uma teoria da evolução, segundo a qual características adquiridas pelo uso seriam transmitidas aos descendentes enquanto o desuso teria a propriedade de elimina-las, as idéias criacionistas ainda predominava em 1859, quando o livro A Origem das espécies foi publicado. Darwin justificava a partir de observações primorosas colhidas na célebre viagem pelas ilhas galápagos, a idéia causadora da mais profunda revolução no pensamento científico da história: “Todas nossas plantas e animais descendem de algum ser no qual a vida surgiu antes”.

Mas a genialidade maior de Darwin foi intuir o mecanismo segundo o qual as espécies surgem e desaparecem no decorrer do tempo: a seleção natural, paradigma jamais imaginado. Num mundo de recursos limitados, a vida segue um fluxo contínuo de evolução, resultado da competição pela sobrevivência em que geração após geração se encarrega de eliminar os menos adaptados. Em suas palavras: “Como a seleção natural pela acumulação de sutis variações favoráveis sucessivas, ela não pode produzir modificações grandes ou súbitas; pode agir por passos muito curto e lentos”.

A teoria da seleção natural não foi imediatamente aceita pela comunidade científica, devido ao fato de Darwin acreditar que as características nos descendentes eram uma mistura das respectivas características dos pais. Isso faria com que em uma geração o caráter retornasse em direção à média, portanto, impossibilitando a variação genética adicional. Pesquisadores importantes como Fisher, Haldane e Wright contribuíram grandemente para conciliar a teoria da seleção natural e a teoria da herança Mendeliana, dando início à genética de populações evolucionária (Mayr, 2005).

Devido as observações de alto polimorfismo no nível de proteínas, Kimura, em 1968, propôs a Teoria Neutra da evolução molecular: a maioria das mudanças detectadas no nível molecular não está sob seleção natural, não afetam o valor adaptativo e são resultados de processos como mutação e deriva. Como na evolução molecular, modelos neutros de evolução fenotípica têm sido construídos considerando somente a mutação e a deriva genética como forças evolutivas. Estes modelos fornecem base para avaliar se padrões observados de variação de características quantitativas são prováveis de terem surgido na ausência de seleção natural. O modelo de evolução neutra de características quantitativas de Wright (1951) pode ser usado para examinar se a divergência interpopulacional de características poligênicas e marcadores neutros foi causada por processos evolutivos similares. A partir deste modelo Spitze (1993) definiu QST como análogo quantitativo de FST.  , significa a proporção da variância genética aditiva total que é devida as diferenças entre populações, onde é a variância genética aditiva entre demes ea variância genética aditiva dentro de demes. Para traços aditivos neutros espera-se QST = FST; para populações adaptadas a diferentes locais tem-se QST > FST e sob seleção estabilizadora para o mesmo fenótipo QST < FST. A diferenciação adaptativa do caráter pode ser alcançada com pequena diferenciação das frequências alélicas dos locos. As covariâncias aumentam a diferenciação do traço além do que poderia ser esperado pela soma das frequência alélica. Com divergência neutra os locos diferenciam-se independentemente entre populações dando covariâncias que são em média zero. Então, a interpretação da variação genética deve ser distinguida entre: 1) marcadores moleculares neutros, 2) características genéticas quantitativas e 3) genes (QTLs). Cada tipo de variação tem seu próprio padrão os quais não são, necessariamente, correlacionados com os outros tipos.

Pequenas variações na seqüência de nucleotídeos de um gene pode levar à formação de novos alelos e a freqüência destes pode variar de acordo com a dinâmica da populacional da espécie. A divergência genética nas espécies não se deve somente às “forças evolutivas”, vários processos interagem de forma intrincada. Fenômenos, como a poliploidia e a atuação de transposons, podem contribuir para grandes mudanças no genoma de um organismo, o que poderá levar ao “surgimento” de uma espécie.

Estudos recentes refinaram as inferências do número e momento dos eventos de poliploidia (duplicação do genoma) e impacto destes na estrutura genômica. Muitos poliplóides sofrem rápidas alterações genômicas, algumas aparecendo no início da poliploidia. A poliploidia é uma força predominante na evolução de plantas. Genomas de plantas modernas guardam evidências de múltiplos ciclos de eventos passados de poliploidização, muitas vezes seguidos de silenciamento e eliminação de genes duplicados. A poliploidia tem muitos efeitos sobre a expressão gênica, por meio do silenciamento de genes, que acompanham a formação poliplóide, sendo contínua sobre o tempo evolutivo.

Os transposons presentes nos genomas também têm grande importância na evolução, podendo influenciar a trajetória evolutiva de duas formas: (i) via alterações da função do gene mediante inserção, (ii) por meio de indução de rearranjos cromossomais.

Diante da grande diversidade de espécies, o homem sentiu necessidade de classificar os seres vivos para compreender melhor o mundo à sua volta. Inicialmente foi adotada uma classificação prática dos seres vivos, baseada na utilidade do organismo. Posteriormente, os seres vivos foram classificados de acordo com suas características, sendo agrupados num sistema hierárquico. A taxonomia é a ciência responsável por descrever, nomear e classificar os organismos, atuais e extintos, sendo Carlos Lineu (1707-1778) considerado o “pai” da taxonomia e do Sistema de Classificação Binomial.

Além de classificar os organismos, o homem se preocupou em tentar entender a relação entre as diferentes espécies conhecidas. A sistemática é a ciência dedicada a inventariar e descrever a biodiversidade e compreender as relações entre os organismos. Entre 1950 e1960, surgiram duas escolas modernas de sistemáticas: "Fenética" (ou "Numérica") e a "Filogenética" (ou "Cladista" ou "Cladística") (Futuyma, 1992). A escola “Fenética” baseia-se na similaridade global entre as espécies, medida por tantas características quanto possível, sem se preocupar com as relações de parentesco entre os táxons. Os filogeneticistas, por sua vez, baseiam-se exclusivamente na genealogia e procuram saber como ocorreu a história filogenética, estabelecendo graus de parentesco entre os táxons analisados. Na sistemática filogenética a hipótese é construída com base nas novidades evolutivas compartilhadas pelos organismos (sinapomorfias) e considera que a melhor classificação é aquela que reflete a filogenia do grupo, independente do grau de semelhança dos táxons.

O conhecimento das relações filogenéticas entre as espécies é essencial para muitas outras inferências em biologia. Classicamente, as filogenias eram inferidas pelo uso das evidências morfológicas de espécies viventes e fósseis. Agora, as filogenias são cada vez mais inferidas a partir de evidências das seqüências moleculares, sendo essa ciência denominada filogenia molecular.

Dados moleculares têm sido usados para resolver problemas de filogenia de grandes grupos (Lynch, 1999), relações filogenéticas das populações humanas e dos grandes primatas (Satta et al. 2000) ou estudos sobre a evolução de características morfológicas, fisiológicas e comportamentais (O’ Foighil e Taylor, 2000). Dados moleculares têm sido extensivamente usados não somente para esclarecer relações filogenéticas difíceis de abordar por outros métodos, mas também para questionar visões filogenéticas propostas anteriormente.

Sequências alinhadas de nucleotídeos ou de aminoácidos podem ser comparadas quantitativamente por meio de vários modelos que refletem sua semelhança. Em sequências com origem comum, as diferenças entre elas originam-se a de mutações que ocorreram em linhagens que se diversificaram a partir de seu ancestral comum. A quantificação dessas diferenças pode ser utilizada para a inferência de filogenias.

Seqüências de DNA para estudos filogenéticos podem ser obtidas tanto a partir de banco de dados, ou por meio de dados laboratoriais, onde inclui vários passos desde a extração do DNA até o seqüenciamento. Independente da metodologia utilizada, os pesquisadores sempre encontram dois grandes problemas: a escolha da região gênica a ser utilizada para o estudo proposto, e o alinhamento das seqüências.

O conjunto de dados moleculares a ser usado em uma reconstrução filogenética pode ser um conjunto de nucleotídeos ou de aminoácidos. No entanto, a decisão por nucleotídeos e/ou aminoácidos, e ainda qual região gênica, deve ser cuidadosa e levar em consideração a taxa de evolução do gene e o tempo de divergência das espécies a serem estudadas. Russo et al. (1996), analisando a eficiência de diferentes genes e de diferentes métodos de reconstrução filogenética, concluíram que a escolha cuidadosa do gene é muito mais importante do que a escolha do método de reconstrução filogenética.

Quando comparamos a mesma seqüência de DNA em duas espécies e contamos quantos nucleotídeos mudaram, precisamos ter certeza de que cada sítio, em uma espécie, corresponde ao mesmo sítio na outra. As seqüências precisam estar alinhadas corretamente. O objetivo do alinhamento é, portanto, fazer com que a posição de cada base que esteja sendo comparada seja idêntica. Se o alinhamento não é confiável, a identidade proposta também não será, portanto, dificilmente a filogenia produzida será correta. O problema torna-se mais complicado se considerarmos o número de alinhamentos possíveis em uma determinada sequência. Wong et al. (2008), investigando como alinhamentos afetam estudos genômicos, concluíram que estimativas e inferências filogenéticas são sensíveis à diferentes alinhamentos obtidos por diferentes programas.

Apesar dessas dificuldades, não significa que a filogenética molecular é uma metodologia fraca ou mais incerta do que a média. Uma árvore filogenética constitui uma hipótese sobre a história evolutiva, não podendo ser provadas com certeza absoluta. É possível, porém, agrupar evidências favoráveis e contrárias a uma hipótese filogenética.

 

 

 

 

Referências

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FUTUYMA, D. J. Biologia evolutiva. Traduçã: Mario de Vivo e coord. De Fábio de Melo Sene. 2 ed. Ribeirão Preto, Sociedade Brasileira de Genética/CNPq, 1992.

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WRIGHT, S. The genetical structure of population. Ann. Eugenics 15, 323-354, 1951.

 

 

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          Jacqueline Siqueira Glasenapp                    Orientador: Vicente W. D. Casali

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

     

 

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                    Juliana Stival Sena                              Orientadora: Elza F. de Araújo

 

 

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           Maíra Cristina Menezes Freire                  Orientador: Luiz Orlando de Oliveira

 

 

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                     Caio Césio Salgado                           Orientador: Cosme Damião Cruz

 

 

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           Gustavo A. M. Guimarães                       Orientador: Sérgio Brommonschenkel