Universidade Federal de Viçosa

Programa de Pós Graduação em Genética e Melhoramento

                               

 

 

Seminário de Tema livre

Palestrante: Jefferson de Brito Marthe

Oriendatora: Mara Garcia Tavares

 

Questões da Genética Populacional Brasileira e as Cotas Raciais

 

As contas raciais:

 

Cerca de 33 universidades já adotaram o sistema de cotas segundo o MEC, incluindo UnB, UFP, UERJ e outras, embora nada tenha ainda sido aprovado, em termos de projeto de lei. Na verdade dois projetos tramitam na Câmara dos Deputados: a lei de cotas e o estatuto da igualdade racial. Se as duas propostas forem aprovadas, pelo menos 50% das vagas nas universidades públicas serão preenchidas por negros. Assim, o que valerá em primeiro lugar será a cor da pele, sendo a aprovação do vestibular pelo mérito acadêmico, como algo de segundo plano. Também deverá ser reservada para negros, vagas no serviço público, nas empresas privadas e até em propagandas na TV e no cinema. Em documentos oficiais, como a carteira do INSS e o prontuário médico, todos os brasileiros serão classificados pela "raça". Isto são medidas que o governo pretende adotar, chamadas de Ações Afirmativas e baseia-se no exemplo norte-americano, após o fim de seu apartheid nos anos 60 do século passado. Entretanto, essa iniciativa governamental tem gerado situações contraditórias ao longo do tempo em que esse assunto foi posto em pauta a exemplo dos irmãos gêmeos que tentaram vestibular na UnB.

 

A colonização, miscigenação e a questão genética no Brasil:

 

No final do século XV, os europeus, chegando ás Américas, encontraram um continente habitado por milhões de pessoas (Salzano e Bortolini. 2002). Isto não impediu que o continente fosse conquistado. E foram os europeus que promoveram a vinda dos primeiros escravos africanos para as terras recém-descobertas. Nos quatro séculos que se seguiram, cerca de doze milhões de africanos das regiões do Sul do Saara foram transportados para as Américas. Destes, quatro milhões foram trazidos para o Brasil, sendo a grande maioria deles originado da costa Atlântica (África central e ocidental) (Pena e Bortolini. 2004).

Devido a numerosas questões, incluindo as de natureza demográfica, uma intensa mistura gênica ocorreu entre colonizadores, colonizados e escravizados, desde o início desse contato. Por séculos, a extensão dessa mescla foi mensurada por critérios de aparência física. Inúmeros termos surgiram ao longo dos anos para definir a classificar pessoas que tinham como ancestrais africanos, europeus e ameríndios em várias combinações: mulato, cabloco, mameluco, pardo e dezenas de outros, muitos dos quais impregnados de preconceito (Pena e Bortolini. 2004).

Neste contexto histórico foi realizado um estudo de genética molecular e populacional para estimar a contribuição africana para a formação do povo brasileiro. Foram examinados o DNA mitocondrial e o DNA nuclear de brasileiros autoclassificados como brancos de várias regiões do Brasil. Os estudos mitocondriais revelaram que aproximadamente 30% dos brasileiros autoclassificados como brancos e 80% dos negros apresentam linhagens maternas características da África subsaariana (Pena e Bortolini. 2004). As análises de polimorfismos nucleares estimaram que aproximadamente 146 milhões de brasileiros (86% da população) apresentam mais de 10% de contribuição africana em seu genoma

            A partir destes dados, estima-se que, pelo menos, 89 milhões de brasileiros são afrodescendentes, um número bem superior aos 76 milhões de pessoas que se declararam negros (pretos e pardos) no censo de 2000 do IBGE.

Estes números devem ser levados em conta nas discussões sobre ações afirmativas no Brasil, mas em um sentido descritivo e não prescritivo, ou seja, não cabe a genética fazer prescrições sociais e dar o aval final. Ela apenas dará os meios para se pensar na tomada de decisões que se dará, senão, apenas na área da esfera política (Pena e Bortolini. 2004).

Espero que este seminário seja útil para ampliar os horizontes sobre a questão das cotas. O que está em debate não é o fato de injustiças do passado como a escravidão e a discriminação racial não precisarem de reparação, mas sim a forma como essa injustiça será reparada. O que ocorre é que pouco debate tem sido feito sobre a questão das cotas. O governo quer colocar essas medidas em prática, sem nenhuma consulta popular; apesar de saber que este é um assunto que divide opiniões.

 

 

 

Referências bibliográficas:

 

CANN, R. L.; STONEKING, M. & WILSON, A. C. (1987). Mitochondrial DNA and Human Evolution. Nature, 325: 31-36.

HAILE-SALASSIE, Y.; ASFAW, B. &  WHITE, T. D. (2004). Hominid Cranial Remains from upper Pleistocene Deposits at Aduma, Middle Awash, Ethiopia. Am. J. Physical. Anthropol. 123:1-10.

PENA, S. D. J. & BORTOLINI, M. C. (2004). Pode a genética definir quem deve se beneficiar das cotas universitárias e das ações afirmativas? Estudos Avançados 18(50): 31-50.

SALZANO, F. M. & BORTOLINI, M. C. (2002). Evolution and Genetics of Latin American Populations. Cambridge, Cambridge University Press, 2002.

WHITE, T. D., ASFAW, B., DEGUSTA, D., GILBERT, H., RICHARDS, G. D., SUWA, G. & HOWELL, F. C. (2003). Pleistocene Homo sapiens from Middle Awash, Ethiopia. Nature, 423: 742-747.

 

 

 

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    Jefferson de Brito Marthe                                            Mara Garcia Tavares 

                (Estudante)                                                            (Orientadora)