Universidade Federal de Viçosa

Programa de Pós Graduação em Genética e Melhoramento

Seminário de Tema Livre                              

 

GENÉTICA DA INTERAÇÃO PLANTA-PATÓGENO

 

Prelecionista: Alexandre Alonso Alves

Orientador: Acelino Couto Alfenas DFP/BIOAGRO/UFV

 

               A história da genética da interação planta-patógeno se confunde com a própria história da genética, uma vez que seu surgimento se deu pouco tempo depois da publicação dos trabalhos de Mendel e da redescoberta destes por Correns e De Vries. Biffen (1905) demonstrou pela primeira vez a natureza genética da resistência de plantas a doenças marcando o início da genética da interação planta-patógeno como ciência. Desde então, e principalmente após os trabalhos conciliadores de Nielsson-Ehle, o número de pesquisas conduzidas no intuito de se identificar as bases genéticas e mais recentemente, as bases moleculares que regem uma determinada interação entre patógeno e hospedeiro têm aumentado assustadoramente (Camargo, 1995). Esse crescente interesse justifica-se pela necessidade de se aumentar cada vez mais a produção de alimentos e matéria prima para suprir as necessidades de uma população mundial crescente e carente. A genética da interação planta-patógeno como ciência ocupa-se principalmente do estudo das bases genéticas da resistência e mais recentemente das bases moleculares da mesma. A resistência de plantas a doenças apesar de ser a primeira vista relativamente simples, revela-se bastante complexa à medida que se aprofunda no conhecimento da mesma. Uma infinidade de termos e conceitos, muitos de sentido pouco claro, permeiam a literatura especializada, em função dos diferentes tipos de resistência observados. Na natureza, a resistência de plantas a doenças é regra ao passo que a suscetibilidade é exceção (Pascholatti, 1995). Basta observar a infinidade de microrganismos aos quais as plantas estão diariamente expostas, para se comprovar que apenas uma pequena porção desses microrganismos é capaz de causar doenças em plantas. Esse fato é garantido por mecanismos pré-formados (espessura da cutícula, número e disposição de estômatos e tricomas) e pós-formados (substâncias fungitóxicas e antiproteicas) atuantes nessas plantas e que em conjunto chamamos de resistência de planta não hospedeira (Pascholatti, 1995). Mesmo nos casos em que determinados microrganismos são capazes de causar doenças, observamos que as plantas infectadas por eles, não são completamente suscetíveis, apresentando graus variáveis de resistência. O tipo de resistência de plantas a doenças mais comum, e também melhor estudada por geneticistas, melhoristas e fitopatologistas é a resistência qualitativa. Nesse tipo de resistência observa-se classes distintas de fenótipos, resistente e suscetível, sendo por isso chamada de resistência qualitativa ou do “tudo ou nada” por fitopatologistas. Esse tipo de resistência é controlado geneticamente por um único gene, e em função disso, o melhoramento visando incorporar a resistência em cultivares pode ser conduzido de maneira bastante simples, por meio de retrocruzamentos na maioria das vezes. Outro tipo de resistência, menos estudada e compreendida, é a chamada resistência quantitativa, onde ao invés de se observar classes distintas, como no caso anterior, observa-se uma variação contínua de fenótipos, sendo possível identificar indivíduos que vão do extremo de suscetibilidade ao extremo de resistência. Essa variação extensa de fenótipos indica um controle poligênico da característica, e isso torna o processo de avaliação da resistência e consequentemente o processo de melhoramento de plantas, visando resistência, bastante complexo e laborioso, requerendo métodos adequados de quantificação de doenças. O melhoramento de plantas enfrenta aqui um dilema, uma vez que existem evidências de que à medida que as cultivares ganham em produtividade perdem em resistência quantitativa. Vanderplank, fitopatologista sul-africano instituiu os conceitos de resistência vertical e horizontal, que passaram a ser sinônimos de resistência monogênica e poligênica, respectivamente. Segundo Vanderplank (1963), a resistência vertical é especifica a determinadas raças do patógeno, sendo essa especificidade determinada em função dos genes de resistência presentes na cultivar, ao passo que a resistência horizontal refere-se à resistência da mesma cultivar a quaisquer raças do patógeno. Contudo, o correto entendimento das bases genéticas e moleculares da interação planta patógeno somente foi possível após os trabalhos pioneiros de H.H. Flor. Flor (1956) trabalhando com o patossistema Linho-Ferrugem do Linho postulou sua famosa teoria gene-a-gene, onde afirma que para cada gene de resistência do hospedeiro, existe um gene respectivo de avirulência no patógeno. Desse modo, a interação incompatível, ou seja, resistência somente pode ocorrer se houver o reconhecimento da proteína de avirulência do patógeno pela proteína de resistência da planta. Modelos do tipo receptor-elecitor e do tipo sentinela ou “guarda” têm sido propostos para explicar tal reconhecimento. É importante enfatizar que os genes R, apesar de possuírem enorme importância no processo de resistência, não atuam sozinhos. Vários outros genes, ativados via transdução de sinais, coordenam desde respostas rápidas e localizadas até repostas sistêmicas que em conjunto promovem a resistência. Atualmente, diversas ferramentas de biologia molecular estão disponíveis e sendo rotineiramente usadas em estudos de genética da interação planta patógeno, como é o caso do mapeamento genético (Junghans et al., 2003), microarranjos de DNA (Kazan et al., 2001) e bibliotecas de subtração (Ros et al., 2000). Plantas e patógenos vêm a milhares de anos co-evoluindo, e nessa guerra infindável, os patógenos, em função de sua diversidade e capacidade de adaptação tem se sobressaído. Contudo, atualmente, graças aos esforços de geneticistas, melhoristas e fitopatologistas, muitas plantas exibem níveis elevados de resistência que garantem uma maior produção e melhor qualidade. Assim, estudos sobre genética da interação planta-patógeno continuará garantindo um maior conhecimento e compreensão dos mecanismos dessa interação e a geração de plantas mais resistentes, o que indubitavelmente contribuirá para a continuidade da produção de alimentos e matéria prima em larga escala.

 

Biffen, R. H. Mendels law of inheritance and wheat breeding. J. Agric. Sci. 1:4-48. 1905

Camargo, L.E.A. Análise Genética da Resistência e da Patogenicidade. In: Bergamin Filho, A., Kimati, H., Amorin, L. Manual de Fitopatologia: princípios e conceitos. vol 1. Piracicaba. Editora Ceres. 470-492. 1995.

Flor, H.H. The complementary genic systems in flax and flax rust. Advances in Genetics 8:29-54. Academic Press, New York. 1956.

Junghans, D.T., Alfenas, A.C., Brommonschenkel, S.H., Oda, S., Mello, E.J., Grattapaglia,D. Resistance to Rust (Puccinia psidii) in Eucalyptus: Mode of Inheritance and mapping of major gene with RAPD markers. Theor Appl Genet 108:175–180. 2003.

Kazan, K., Schenk, P.M., Wilson, I. & Manners, J.M. DNA microarrays: New tools in analysis of plant defenses responses. Molecular Plant Pathology. 2(3). 177-185. 2005.

Pascholatti, S.F., Leite B. Hospedeiro: mecanismos de resistência. In: Bergamin Filho, A., Kimati, H., Amorin, L. Manual de Fitopatologia: princípios e conceitos. vol 1. Piracicaba. Editora Ceres. 415-453. 1995.

Ros, B., Thümmler, F., Whentezl, G. Analysis of differentially expressed genes in susceptible and moderately resistant potato cultivar upon Phytophthora infestans infection. Molecular Plant Pathology. 5(3) 191-201. 2004.

Vanderplank, J.E. Plant Diseases: Epidemics and Control. New York: Academic Press, 1963.