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Clonagem de animais: Regulamentar ou não?

Por: Reginaldo Minaré

 

No Brasil, o debate envolvendo a regulamentação de vegetais geneticamente modificados, e o uso de célula-tronco embrionária, vêm chamando a atenção do Parlamento, do Governo, da imprensa e do público em geral de tal forma que pouco espaço tem sido dedicado à discussão sobre a clonagem de animais, inclusive de Animais Geneticamente Modificados AnGMs. Logo que o grupo escocês criou a ovelha Dolly em 1997, muito se falou sobre a clonagem. Todavia, a preocupação caminhou para a clonagem humana e o diálogo social sobre a clonagem de animais deixou de acontecer de forma mais aprofundada. Embora seja comum encontrar notícias na imprensa, poucos são os textos que de alguma forma problematizam o tema para provocar a reflexão e até mesmo a popularização dessa tecnologia que certamente muito será utilizada em um futuro bastante próximo.

Após a clonagem da ovelha Dolly, cientistas americanos já clonaram gatos, cientistas brasileiros clonaram vacas e cientista italianos clonaram égua. Todavia, a simples clonagem de animais já não emociona tanto nem garante que o País faça parte do seleto grupo que domina a biotecnologia mais avançada. Nesse campo, o que efetivamente tem emocionado e garantido a posição de vanguarda, é o domínio conjunto das técnicas de modificação genética de animais e clonagem dos mesmos.

Cientistas taiwaneses modificaram porcos que ficaram verdes; pesquisadores americanos modificaram salmão para crescer mais rápido; o mesmo grupo escocês que clonou a Dolly silenciou o gene de um porco, gene que eles consideram ser o responsável pela rejeição do órgão do animal em procedimento de transplante para humanos, e fizeram clones dos mesmos; cientistas argentinos modificaram geneticamente uma vaca para que a mesma produza um hormônio de crescimento humano; investigadores americanos produziram e clonaram uma vaca que foi modificada com material genético do sistema imunológico humano para que produza anticorpos; e pesquisadores neozelandezes modificaram uma vaca para produzir leite com mais proteínas e já fizeram seu clone. Esses casos são exemplos do que as biotecnologias de modificação genética de animais e de clonagem podem proporcionar.

Trata-se, portanto, de técnicas recentes cujo potencial de evolução e utilização é imenso e algumas de suas potencialidades nos levam a refletir e comentar sobre situações que até pouco tempo, fora do privilegiado clube de roteiristas hollywodianos, seria considerada “coisa de maluco”. Exemplos são os estudos sobre a possibilidade de clonar animais extintos, cujo material genético foi preservado de alguma forma, como são os casos do mamute encontrado congelado na Sibéria e do carrapato pré-histórico encontrado preservado em âmbar em Nova Jersey, que pode até ter se alimentado de sangue de algum dinossauro e proporcionar a recuperação do material genético do bicho.

No Brasil, a modificação genética de animais é uma atividade permitida e regulamentada pela Lei nº 11.105/05, sendo os procedimentos e as medidas de biossegurança estabelecidas pelas instruções normativas da Comissão Técnica Nacional de Biossegurança - CTNBio, especialmente as Instruções Normativas 03, 12, e 13, que em alguns aspectos deverão ser reformuladas pela Comissão, visto que foram elaboradas sob a égide da Lei 8.974/95, que foi revogada pela Lei 11.105/05. Já a clonagem de animais é uma atividade permitida, mas não regulamentada. Para aqueles que olham com certa restrição para o estabelecimento de regras, a situação que se encontra o desenvolvimento e uso da técnica de clonagem de animais é o ideal. Todavia, por se tratar de uma técnica que envolve situações diversas e algumas de grande complexidade, um mínimo de regulamentação pode ser importante.

Exigir o registro das instituições que prestam serviço na área de clonagem em órgão competente; criar um sistema de rastreamento dos animais clonados geneticamente modificados ou não; exigir a identificação e o registro, pelo prestador de serviço, do interessado na clonagem de animais; a identificação e registro da procedência do material genético objeto da clonagem; exigir a apresentação, pelo interessado na clonagem de animal geneticamente modificado, da decisão técnica da CTNBio em processo de liberação comercial ou pesquisa; criar um cadastro funcional e seguro para identificação e certificação da procedência do material genético armazenado para clonagem futura; disciplinar o uso de células somáticas, que podem ser utilizadas para clonagem, e são encontradas em sêmen que foi vendido para fertilização in vitro e não para realização de clonagem; regular o mercado de venda de material genético de animais de elite; disciplinar a clonagem e a liberação no meio ambiente de clone de animal silvestre; e controlar a clonagem e a liberação de clone de animal extinto no meio ambiente, são exemplos onde uma regulamentação adequada poderá contribuir para que essa técnica seja aperfeiçoada e utilizada dentro de critérios de segurança e controle que sirvam para minimizar a probabilidade de ocorrência de acidentes e problemas comerciais que podem desestimular o seu aperfeiçoamento e uso.

            Considerando o interesse mundial pelo assunto e o grande potencial de uso da tecnologia de clonagem, tanto no mercado de animais de elite quanto aplicada aos animais desenvolvidos para o uso pela indústria farmacêutica e medicina, resta evidente que o Brasil precisa urgente pensar sua política para o setor, identificar seus objetivos, organizar seus investimentos e pavimentar, com boa regulamentação, um caminho garantidor da realização da política, do alcance dos objetivos e do adequado aproveitamento dos parcos investimentos. Inclusive, temos como exemplo os problemas ocorridos no âmbito do desenvolvimento da biotecnologia vegetal e seria lamentável repetir os mesmos equívocos.

            Sobre o assunto, tramita atualmente na Câmara dos Deputados o Projeto de Lei nº 6131/05, que propõe a regulamentação da clonagem de animais, animais de elite, geneticamente modificados, silvestres, em risco de extinção e extintos. A discussão do citado projeto, que aguarda criação de Comissão Especial, certamente será um ótimo ponto de partida para a sociedade interessada contribuir com a adequada regulamentação do tema e até mesmo decidir se essa regulamentação é efetivamente interessante para os diversos setores.

 

Brasília, 20 de janeiro de 2006

 

Reginaldo Minaré
Advogado e Diretor Jurídico da ANBio
rminare@uol.com.br

 

 

* Veja na Home-Pege da ANBio (www.anbio.org.br) na seção de Destaque de novo o  PROJETO DE LEI N°  6131, DE 2005 (Da Sra. Deputada Federal KÁTIA ABREU)