Universidade Federal de Viçosa

Programa de Pós Graduação em Genética e Melhoramento

Mesa Redonda

 

Debatedores: Cristiane Zorzatto, Denise Alvares Pereira, Kelly Mayrink Balmant e Renan de Souza Cascardo

Moderadora: Poliane Alfenas-Zerbini

 

Silenciamento gênico induzido por vírus

 

O termo “Silenciamento Gênico” refere-se a uma série de mecanismos por meio dos quais a expressão de um gene é regulada negativamente. Esse processo gera modificações celulares epigenéticas, que podem ser herdadas para as células filhas através da mitose, sem que haja alteração na sequência de nucleotídeos do DNA (Alberts et al., 2008).

A partir da década de 90, vários fenômenos de silenciamento gênico em nível transcricional e pós-transcricional foram relatados em plantas, fungos, animais e protozoários. Um dos primeiros fenômenos de silenciamento em plantas foi descrito em 1990 por pesquisadores que tentavam produzir petúnias com uma pigmentação violeta mais intensa. Uma cópia extra do gene que produz a enzima chalcone sintase (CHS), responsável pela coloração violeta das flores, foi inserida em petúnias por meio de transgenia. Para surpresa dos pesquisadores, não foram obtidas plantas com flores de coloração mais intensa e sim plantas com flores totalmente brancas. Análises moleculares mostraram que nestas plantas trangênicas com flores brancas o transgene e a cópia endógena do gene não estavam sendo expressas. Esse fenômeno foi denominado “co-supressão” (Napoli et al, 1990).

O processo de silenciamento gênico pós-transcricional (PTGS) é um mecanismo conservado em organismos eucariotos. É disparado por uma molécula de RNA fita dupla (dsRNA) que é processado pela Dicer em pequenos RNAs (smRNAs) de aproximadamente 21-24 nucleotídeos. O smRNA resultante associa-se então a proteínas que discriminam qual das duas fitas será incorporada ao complexo de silenciamento RISC (RNA induced silencing complex) (Tomari et al., 2004). O complexo RISC “escanea” os mRNA existentes na célula, direcionando a clivagem sequência-específica de mRNAs complementares (Hutvagner & Zamore, 2002). Essa clivagem é realizada pela proteína AGO.

Uma característica marcante do silenciamento de RNA é seu caráter sistêmico, ou seja, o processo não fica restrito às células iniciais em que foi disparado. Em plantas, acredita-se que o sinal sistêmico seja capaz de mover célula-a-célula via plasmodesmas (Himber et al., 2003) e a longas distâncias via floema (Mallory et al., 2003).

Além de ser um mecanismo de controle da expressão de genes endógenos, existem evidências de que o silenciamento de RNA é um mecanismo natural de defesa contra vírus. Uma das principais evidências é o fato de que os vírus não apenas podem induzir o silenciamento, mas também são alvos do mecanismo. Como forma de suplantar esse mecanismo de defesa, alguns vírus codificam proteínas que possuem a capacidade de suprimir a via de silenciamento. Essas proteínas são denominadas supressores. Os supressores podem afetar o silenciamento de diversas maneiras, seja interferindo no seu caráter sistêmico, bloqueando a atividade dos siRNAs, ou protegendo o RNA viral de degradação pela maquinaria celular. Por exemplo, a proteína HC-Pro (Potyviral helper-component protease) de potyvírus exerce sua atividade supressora ao afetar negativamente o acúmulo dos siRNAs (Mallory et al., 2001), impedindo o processamento de dsRNA pela Dicer. Estudos envolvendo a proteína supressora p19 do tombusvírus Tomato bushy stunt virus (TBSV) indicaram que o mecanismo de supressão de p19 é mediado pelo seqüestro dos siRNAs produzidos pela Dicer, impedindo que estes sejam incorporados ao RISC (Silhavy et al., 2002).

            Os estudos sobre supressores de silenciamento demonstram que o processo normalmente é parcial ou incompleto. Por exemplo, a proteína HCPro dos potyvírus é capaz de suprimir o silenciamento intracelular, mas não é capaz de impedir a disseminação do sinal sistêmico (Mallory et al., 2001). Ao contrário, a proteína 2b do CMV impede a disseminação do sinal sistêmico, no entanto não é capaz de reverter o silenciamento intracelular (Guo & Ding, 2002). Como conseqüência, o sinergismo em infecções mistas de diferentes vírus pode ocorrer quando suas proteínas supressoras afetarem o silenciamento em pontos diferentes, ou mesmo ponto, porém de forma distinta.

O silenciamento gênico induzido por vírus (VIGS) tem se destacado como uma importante ferramenta da genética reversa, permitindo a descoberta e validação de funções gênicas (Eamens et al., 2008). Esses estudos são realizados por meio da inoculação de plantas jovens com vetores virais que carregam um fragmento do gene alvo, visando o desencadeamento do PTGS e análise do fenótipo resultante (Unver & Budak, 2009).             

Diversos vírus de planta têm sido modificados para a construção de vetores virais para indução de VIGS. Dentre eles, o TMV, PVX e TRV são os mais utilizados. A utilização de vetores virais em estudos de genética reversa possui várias vantagens quando comparada a outras técnicas de análise funcional em plantas, como o knocking-out ou interrupção gênica. Apesar de apresentar algumas limitações, o método de VIGS geralmente é escolhido pela rapidez de geração de fenótipos, por ter custo relativamente baixo e não requerer sistemas de transformação e regeneração in vitro (Burch-Smith et al., 2004; Unver & Budak, 2009). Atualmente, a aplicabilidade de estudos baseados no PTGS está sendo demonstrada em diversos ramos, que abrangem desde a produção de flores com diferentes colorações, a melhoria da qualidade nutricional de alimentos, a resistência antiviral e a defesa contra outros tipos de patógenos, como Agrobacterium  e Heterodera (Eamens et al., 2008). Estudos realizados com viroses humanas mostraram ainda que o uso de RNAs como indutores de silenciamento também pode ser promissor para fins terapêuticos (Pan et al., 2009).

 

Referências:

 

·   Alberts, B., Johnson, A., Lewis, J., Raff, M., Roberts, K., Walter, P (2008) Molecular Biology of the Cell, Garland Science, New York, 1.268p.

·   Burch-Smith T. M, Anderson J. C., Martin G.B. , Dinesh-Kumar S. P. (2004) Applications and advantages of virus-induced gene silencing for gene function studies in plants. Plant J 39: 734–746.

·   Eamens, A., Wang, M-B., Smith, N. A, Waterhouse, P. M. RNA silencing in plants: Yesterday, today and tomorrow. Plant Phisiol. 147: 456-468.

·   Guo, H.S. & Ding, S.W. 2002. A viral protein inhibits the long range signaling activity of the gene silencing signal. EMBO Journal 21:398-407.

·   Himber, C.; Dunoyer, P.; Moissiard, G.; Ritzenthaler, C. & Voinnet, O. 2003. Transitivity-dependent and -independent cell-to-cell movement of RNA silencing. EMBO Journal 22:4523-33.

·   Hutvagner, G. & Zamore, P.D. 2002. A microRNA in a multipleturnover RNAi enzyme complex. Science 297:2056-60.

·   Mallory, A.C.; Mlotshwa, S.; Bowman, L.H. & Vance, V.B. 2003. The capacity of transgenic tobacco to send a systemic RNA silencing signal depends on the nature of the inducing transgene locus. Plant Journal 35:82-92.

·   Mallory, A.C.; Ely, L.; Smith, T.H.; Marathe, R; Anandalakshmi, R.; FAgard, M.; Vaucheret, H.; Pruss, G.; Bowman, L. & Vance, V.B. 2001. HC-Pro suppression of transgene silencing eliminates the small RNAs but not transgene methylation or the mobile signal. Plant Cell 13:571-83.

·   Napoli, C., Lemieux, C., Jorgensen R. (1990) Introduction of a chimeric chalcone synthase gene into petunia results in reversible co-suppression of homologous genes in trans. Plant Cell 2: 279–289.

·   Pan, Q.,  Henry, S. D., Metselaar, H. J., Scholte, B., Kwekkeboom, J.,  Tilanus, H. W.,  Janssen, H. L. A., van der Laan, L. J. W. Combined antiviral activity of interferon-α and RNA interference directed against hepatitis C without affecting vector delivery and gene silencing.

·   Ratcliff, F., Martin-Hernandez, A.M,  Baulcombe, D. (2001). Tobacco rattle virus as a vector for analysis of gene function by silencing. Plant J. 25: 237-245.

·   Silhavy, D.; Molnar, A.; Lucioli, A.; Szittya, G.; Hornyik, C.; Tavazza, M. & Burgyan, J. 2002. A viral protein suppresses RNA silencing and binds silencing-generated, 21- to 25-nucleotide doublestranded RNAs. EMBO Journal 21:3070-80.

·   Tomari, Y.; Matranga, C.; Haley, B.; Martinez, N. & Zamore, P.D. 2004. A protein sensor for siRNA asymmetry. Science 306:1377-80.

·   Unver, T., Budak, H. (2009) Virus-induced gene silencing, a post transcriptional gene silencing method. Int. J. Plant Genomics 2009: 198680.

 

 

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Cristiane Zorzatto                                                           Denise Alvares Pereira

                                                                                                 

 

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Kelly Mayrink Balmant                                        Renan de Souza Cascardo

                              

 

 

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Poliane Alfenas-Zerbini (Moderadora)