Quando vejo uma moça no esplendor
dos seus 20 anos, tragando a fumaça do seu cigarro,
imagino que aquela boca fora feita para finalidade bem
mais nobre, como ser beijada, do que ser uma chaminé
fumegante, mal-cheirosa e com os dentes amarelados ou
enegrecidos pelo efeito da nicotina e do alcatrão.
E contemplo naquela esbelta figura
todas as mulheres que fumam e que introduzem nos seus
organismos, bem mais de 400 substâncias químicas
diferentes, algumas altamente prejudiciais à saúde,
como a nicotina, mitroso nornicotina, monóxido de
carbono, acroleína, benzeno, tolueno, cresol, fenol,
cloreto de vinila, benzoantraceno, benzopireno, etc.
Essas substâncias foram detectadas no tabaco através de
análises químicas conduzidas pelos pesquisadores
Hoffmann e Brunnemann, em 1976/77.
Criadas para compartilhar a mais
sublime função do casamento, que é o sexo, e, através
dele, assegurar a perpetuação da espécie, muitas vezes
fracassam nesse mister, pelo tresloucado vício do
cigarro.
Pesquisadores da Universidade da
Califórnia, liderados por Brenda Eskenazi, estudando a
capacidade de fecundação de 1.341 mulheres jovens,
verificaram que elas têm uma taxa de fertilidade 50 por
cento menor que a taxa de fertilidade das não-fumantes.
Mesmo consumindo menos de 10 cigarros por dia, a
capacidade de engravidar é menor do que o normal,
segundo artigo publicado na revista Epidemiology, em
março de 95.
Apesar dos fatores desfavoráveis,
algumas mulheres dependentes do cigarro conseguem
engravidar. Nessa situação, elas passam para o feto
basicamente duas substâncias: o monóxido de carbono e a
nicotina, responsáveis por quase todas as anomalias que
ocorrem no desenvolvimento do feto, principalmente quando
a mãe continua fumando nos quatro últimos meses de
gravidez.
Em estudos em que se visou
determinar a variação na concentração do monóxido de
carbono no sangue dos viciados, verificaram que os
níveis desta substância aumentam de acordo com o
número de cigarros fumados. Verificaram também que
existe uma correlação positiva nas concentrações do
monóxido de carbono e da carboxiemoglobina. Se a fumaça
do cigarro faz com que o teor de monóxido de carbono na
circulação seja aumentado, também o teor de
carboxiemoglobina cresce. Este aumento tem reflexo
negativo na quantidade de oxigênio encontrado no sangue
e qualquer aumento na concentração da carboxiemoglobina
significa diminuição proporcional na quantidade de
oxigênio disponível para o metabolismo celular. é
sabido também que o monóxido de carbono do sangue
materno atinge o feto através do sangue placentário,
quase sempre provocando hipoxia.
Estudos posteriores mostraram que
os teores de carboxiemoglobina, tanto no sangue das
gestantes tabagistas como no sangue dos recém-nascidos,
acusam níveis que variam em média de dois a oito por
cento em ambos. Quando esta concentração atinge nove
por cento, verifica-se acentuada queda no fornecimento de
oxigênio para o feto. Para compensar esse déficit, é
necessário aumentar a concentração de hemoglobina no
sangue materno em mais ou menos 40 por cento, o que não
é fácil em países onde a maioria da população é
carente e sem recursos para melhoria da alimentação,
principalmente do ponto de vista protéico.
Paralelamente, associam-se a essa
diminuição no teor de oxigênio os efeitos prejudiciais
da nicotina. Este alcalóide, reconhecidamente
vasoconstritor, não só aumenta a resistência do fluxo
sangüíneo, como também estimula a glândula
supra-renal a fabricar mais epinefrina (adrenalina),
substância que provoca aumento no batimento cardíaco,
sobrecarregando o coração obrigando-o a um trabalho
maior. Essa vasoconstrição que ocorre na circulação
sangüínea da gestante, de acordo com Manning e
Feyeraband, ocorre também na circulação placentária e
fetal. Por isso, o coração do feto executa em média
cinco batidas a mais por minuto, todas as vezes que a
mãe traga a fumaça do cigarro. Isto representa desgaste
físico com acentuado reflexo no desenvolvimento normal
do feto. A nicotina exerce também ação prejudicial,
interage com as células nervosas, interfere na
liberaçã o dos neurotransmissores, provocando
dependência física, semelhante à provocada pela
heroína e cocaína. Assim, após alguns anos de uso,
aparecem os primeiros sinais de tolerância (o consumidor
passa a fumar mais, para obter os mesmos efeitos); de
compulsão (ansiedade, ânsia incontrolável pelo
cigarro); e, finalmente, os sintomas de síndrome de
abstinência (mal-estar, irritabilidade, depressão,
suores e tremor das mãos), que se manifestam quando o
fornecimento da droga ao organismo é interrompido
bruscamente. Portanto, é fácil concluir que todos esses
males que atingem a humanidade e obviamente a mulher
grávida, irão atingir o seu filho não apenas durante a
gestação, como também após o nascimento.
Em 1963, Zabriskie analisou o
efeito do cigarro sobre o feto, comparando peso e tamanho
de recém-nascidos de gestantes fumantes e não-fumantes.
Trabalhando com 12.190 gestantes, ele verificou que os
recém-nascidos de mães fumantes, mesmo sem encurtamento
da gravidez, pesavam em média 600 gramas a menos e que o
tamanho era de oito a 10 centímetros menor que o tamanho
normal.
O efeito nocivo do cigarro
interfere também no QI dos recém-nascidos. Butler e
Alberman, analisando em 1969 a capacidade de compreender
e interpretar textos de filhos de mães que fumaram
durante a gravidez, verificaram que é bem menor quando
comparado a filhos da mesma idade de mães não-fumantes.
Em pesquisas desenvolvidas em
conjunto por pesquisadores dos Estados Unidos, Canadá,
Inglaterra, França e Suécia, envolvendo significativo
número de 445 mil gestantes dependentes de cigarro,
verificaram que o aumento do risco, em porcentagem, para
ocorrer aborto é de 65,5; natimortalidade, 59,2; e
mortalidade neonatal, 28,5. Estes números são
impressionantes, e merecem uma reflexão mais profunda.
Os especialistas em doenças
causadas pelo cigarro têm agora uma nova preocupação
em virtude do grande aumento no número de mulheres
fumantes. A Organização Mundial da Saúde (OMS)
informa, em relatório de abril de 95, que existem no
mundo 200 milhões de mulheres viciadas em nicotina e que
500 mil morrem anualmente vitimadas por doenças causadas
pelo tabagismo. No Brasil, existiam no ano passado 12,5
milhões de mulheres fumantes e este número está
crescendo, o que é motivo de preocupação.
Principalmente, porque sabemos que,
dominadas pelo vício, elas perdem gradativamente a
saúde, em razão do efeito de algumas substâncias
químicas do cigarro que atuam na diminuição da
produção das células de defesa do organismo,
neutralizando o mecanismo de funcionamento do sistema
imunológico. Por isso, doenças como câncer, enfisema
pulmonar e distúrbios cardiovascular ocorrem com maior
intensidade em fumantes inveteradas.
O Dr. Michael Erikson, diretor do
Departamento de Fumo e Saúde, do Centro de Controle e
Prevenção de Doenças (CDC), USA, informa que
atualmente há maior probabilidade de as mulheres
morrerem de câncer dos pulmões que de câncer de seio.
Além disso, o fumo tem influência direta sobre o
câncer de colo do útero, segundo dados fornecidos pelos
pesquisadores do Imperial Cancer Research Fund,
Inglaterra, publicados na Revista Lancet. Trabalhos
posteriores relacionaram este tipo de câncer à
presença no útero das fumantes de nitrosaminas, que
são substâncias cancerígenas derivadas do metabolismo
da nicotina.
Pôr tudo isso, torna-se de grande
importância que esses dados sejam cuidadosamente
analisados pelas mulheres e seus maridos e se o
relacionamento sexual entre eles visa, além do gozo e
prazer, a geração de um filho. Nesse caso, a mulher
deve abandonar o vício do cigarro para evitar que um
possível aborto ou o nascimento de um filho anormal
possa estremecer a felicidade dos dois. Que mãe seria
tão insensível a ponto de não sentir nenhum remorso
após essas informações, sabendo que gerou um filho
doente por culpa exclusiva do seu vício? A satisfação
de uma "tragada" seria bastante para justificar
uma tristeza? Meditem sobre isso e decidam.
Cid Martins Batista
Professor Titular da Universidade
Federal de Viçosa, MG
Ex-ProfessorVisitante da
Universidade do Arizona, USA